terça-feira, 12 de maio de 2009

Artigo: DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Segunda, 17 de Março de 2008

DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Luiz Eduardo Gunther (Juiz do TRT da 9ª Região)
Cristina Maria Navarro Zornig (Assessora no TRT da 9ª Região)

Sumário: 1) Competência da Justiça do Trabalho; 2) Determinação de ofício – alcance; 3) Princípio da Devolutividade; 4) Critérios a serem observados; 5) Impugnação e Recursos pelo INSS

1. Competência da Justiça do Trabalho
O parágrafo 3º do artigo 114 da Constituição Federal, bem como o parágrafo único do artigo 876 da CLT, acrescentado pela Lei nº 10.035/00 (DOU 26.10.00), já não deixam mais qualquer dúvida quanto à competência da Justiça do Trabalho para determinar descontos previdenciários dos créditos reconhecidos aos empregados nas sentenças por ela proferidas.
As Orientações Jurisprudenciais nº 32 e 141 da SDI I do C. TST e a decisão do STF no RE 196.517-PR, Rel. Min. Marco Aurélio, de 14.11.00 (Informativo do STF nº 210/00) a confirmam, dispondo, aliás, que esta mesma competência também se estende às contribuições fiscais, da forma por muitos já vislumbrada desde 24.12.92, data da entrada em vigor da Lei nº 8.541/92, cujo art. 46 determina:
"O imposto sobre a renda incidente so­bre os rendimentos pagos em cumprimento da decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o rece­bimento se torne disponível para o bene­ficiário".

2. Determinação de ofício – alcance
Atribuída por lei esta competência, o Judiciário Traba­lhista obriga-se a tomar as providências jurisdicionais para o efetivo recolhimento das contribuições devidas ao INSS e, por extensão, como dito, à Receita Federal, em face do crédito recebido pelo empregado. O Juiz do Trabalho terá de se pronunciar sobre a base de cálculo/salário de contribuição, bem assim sobre quem será o responsável pelos recolhimentos.
Isto, entretanto, não afasta a regra processual de que o Juiz está adstrito aos termos do pedido (artigo 460 do CPC). O “executar de ofício” a que alude o parágrafo 3º do artigo 114 da CF e o artigo 876 da CLT significa apenas que, agora, a Justiça do Trabalho possui competência jurisdicional para atuar no julgamento dos atos pertinentes ao processo de execução em relação às contribuições previdenciárias e, por extensão, às fiscais, em caso de resistência do devedor, o que não era possível, pois antes somente lhe cabia dar ciência do fato ao INSS e à Receita Federal para as providências pertinentes à cobrança do crédito junto à Justiça Federal (Lásaro Cândido Cunha. Reforma da Previdência. SP: Del Rey, 1999. p. 82/83).
A determinação de retenções e descontos não se insere como mera atividade judiciária de caráter administra­tivo a cargo das Secretarias das Varas do Trabalho. Trata-se de típica atividade juris­dicional, presente lide a ser composta, sem conteúdo complementar de ordem pública que a lei faz constar da sentença. Fosse diferente, a Emenda Constitucional nº 20/98 não teria disposto de forma clara acerca de “competência” ou o artigo 876 da CLT, em seu parágrafo único, não teria feito referência a créditos previdenciários devidos em decorrência de “decisão” proferida pelos Juízes e Tribunais do Trabalho.

3. Princípio da devolutividade
Mesmo em casos onde as matérias relativas aos descontos previdenciários e fiscais tenham sido previamente aventadas em defesa, existem julgados entendendo, em face do princípio da eventualidade, que, na hipótese de sentença improcedente, dela tendo recorrido o reclamante, deve o réu renová-las em recurso adesivo, sob pena de impossibilidade de seu exame, pois não se confundiriam com mero critério de liquidação (a exemplo dos juros e correção monetária – Súmula nº 211 do C. TST), e não se tratariam de questões passíveis de serem analisadas de ofício (artigo 166 do Código Civil e artigo 219, parágrafo 5º do CPC). Este posicionamento foi adotado no RO 9.898/00, julgado em 20.02.01, pela E. 2ª Turma do TRT da 9ª Região, no qual foi relator o Juiz Luiz Eduardo Gunther.
Entretanto, sendo a posição unânime da jurisprudência do C. TST e do Excelso Supremo Tribunal Federal em sentido contrário, com fundados argumentos, resolvemos modificar a posição adotada.
Assim, se, na contestação, a empresa ré postula sejam deduzidos os valores relativos a contribuições previdenciárias e fiscais, incidentes sobre o montante eventualmente devido ao autor por força judicial, e a ação é julgada improcedente, não havendo manifestação em sentença sobre o pedido, até porque não foi condenada, deve o tribunal, quando aprecia o recurso, examinar a matéria.
E isso porque, não tendo sido sucumbente a ré, ficou desobrigada de interpor recurso ordinário, e não se fazia obrigatória alegação em contra-razões, por se encontrar ao abrigo do princípio da devolutividade contido no artigo 515 do CPC.
Esse é o sentido de acórdão do C. TST, cuja ementa diz o seguinte: “Julgada improcedente a Reclamatória e havendo recurso do reclamante, que foi provido, deveria o Tribunal manifestar-se acerca do pedido de dedução dos valores relativos a contribuições previdenciárias e fiscais, que fora objeto da contestação, sob pena de, não o fazendo, violar o artigo 515, parágrafo 1º, do CPC” (AC. 3ª T. Proc. TST-RR- 523.663/98.7, julgado em 13.09.00, Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula).
Como asseverado, também o Excelso STF em caso julgado sobre a prescrição argüida em primeiro grau, mas com fundamentos aplicáveis às deduções previdenciárias e fiscais, entendeu, em decisão unânime, que: "Interposto recurso pela parte contrária, possível e cabível exame da questão pela Corte revisora" (AGRE 168.705-4. Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 02.06.95).
Em trabalho escrito a respeito da prescrição, mas que tem incidência analógica aqui, o Min. Marco Aurélio Mendes de Farias Mello deixou assentado que: “A impugnação mediante recurso fica excluída, face a ausência do único pressuposto subjetivo de recorribilidade que é o interesse em recorrer, derivado sempre de gravame sofrido pela parte” (Prescrição – momento propício à articulação. Revista LTr. Vol. 49, nº 8, agosto de 1985. São Paulo: LTr, 1985, p. 911).
São essas as razões que nos levam a concluir: uma vez julgada improcedente a reclamação, e havendo recurso do reclamante, provido este, deve o Tribunal manifestar-se sobre os descontos previdenciários e fiscais postulados em defesa, em respeito ao princípio da devolutividade previsto no artigo 515, parágrafo 1º, do CPC, e aplicável subsidiariamente ao processo do trabalho.

4. Critérios a serem observados no recolhimento
O Juiz do Trabalho, ao sentenciar, seja homologando ajuste entre as partes ou decidindo cognitivamente, deve indicar a natureza jurídica das parcelas decorrentes para efeito de se estabelecer a incidência que virtualmente ocorrerá a título de contribuição previdenciária (artigo 832, parágrafo 3º, da CLT).
Embora não haja qualquer imposição semelhante com relação à Receita Federal, ela certamente lhe aproveitará para efeito de cálculo do imposto de renda, que, igualmente, não incidirá sobre verba indenizatória.
No que diz respeito às deduções à Previdência Social, corrente jurisprudencial, a qual se filia a E. 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, defende que elas devam ser feitas mês-a-mês (Decreto nº 2.173/97, art. 68, § 4º, e Decreto nº 3.048/99, arts. 276 e 277), tanto no que tange à cota patronal quanto à do empregado, observando-se épocas e tabelas próprias, limites de contribuição, e incidência sobre as verbas próprias: incidência sobre o principal corrigido monetariamente, excluídas verbas indenizatórias (por força da decisão proferida pelo STF na ADIN 1659-8, com a conversão da MP 1.596-14/97 na Lei nº 9.528/97 foram vetadas as alterações contidas no § 2º do artigo 22 e na alínea “b” do artigo 28, ambos da Lei nº 8.212/91, os quais estabeleciam, justamente, a incidência previdenciária sobre as verbas indenizatórias), juros moratórios em razão da sua natureza punitiva ao inadimplente, e não remuneratória, bem como FGTS, verba equiparável à antiga indenização por tempo de serviço, que não sofre referida dedução (Lei nº 8212/91, art. 28, § 9º, letra “e” - MP nº 1.663).
O empregador é quem deverá recolher e comprovar nos autos não só os valores das contribuições sociais relativas à cota-parte do empregado (que serão deduzidos do crédito), como também os por ele devidos, sob pena de execução direta pelas quantias equivalentes.
E quanto ao imposto de renda, atendendo ao princípio da capacidade econômica do contribuinte (artigo 145, parágrafo 1º, da CF/88), a mesma corrente destaca que também deve ser obser­vada a época própria, aplicação das alíquotas pertinentes a cada mês, com exceção das verbas não abrangidas pelos res­pectivos descontos, ou seja, verbas indenizatórias e previ­denciárias, na forma da Lei nº 8.541/92, art. 46, § 2º, e Lei nº 7.713/88, art. 6º, inciso V.
O artigo 833 da CLT era assim comentado por Valentin Carrion: “O empregado deve arcar com o encargo, mas não pode sofrer prejuízo por culpa do empregador, que deixou de efetuar o recolhimento oportunamente. Assim, incidirão sobre o crédito as alíquotas devidas às épocas dos vencimentos das parcelas e não o do pagamento. O empregador, culpado pela inadimplência, arcará com a diferença” (Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 25ª ed. SP: Saraiva,2000. p.618).
Esta posição também tem por base o ensinamento de José Marcos Domingues de Oliveira (Capacidade Contributiva – Conteúdo e Eficácia do Princípio. RJ: Ed. Renovar, 1988. p. 70, nota 5), que fundamenta não ser possível admitir a transformação do imposto de renda das pessoas físicas num imposto real (isto é, preocupado exclusivamente com o quantum a arrecadar, deixando-se para trás as suas tradicionais características de imposto pessoal amoldado às condições individuais de cada contribuinte: “... onde couber imposto pessoal (como é o caso da tributação da renda) não poderá ser instituído imposto real, porque aquele é o instrumento mais adequado à oneração da efetiva riqueza do cidadão”) - Revista de Direito Administrativo. 189/92. Renovar. p.70.
Também para esta hipótese os valores deduzidos pelo empregador devem ser recolhidos à Receita Federal e comprovados nos autos, sob pena de execução pela quantia equivalente.
A Orientação Jurisprudencial nº 228 da SDI I do C. TST, todavia, dispõe de forma diversa:
“DESCONTOS LEGAIS. SENTENÇAS TRABALHISTAS. LEI Nº 8.541/92, ART. 46. PROVimento da cgjt nº 03/1984 e alteraçÕes posteriores. O recolhimento dos descontos legais, resultante dos créditos do trabalhador oriundos de condenação judicial, deve incidir sobre o valor total da condenação e calculado ao final”.
Dispõe, por sua vez, o citado artigo 46 da Lei nº 8.541/92:"O imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o recebimento se torne disponível para o beneficiário".A Corte Máxima Trabalhista entende que da leitura do mencionado comando legal conclui-se a intenção do legislador de que os descontos do imposto de renda efetuados sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial incidem sobre o valor total porque estabelece que o devedor está obrigado ao pagamento no momento em que o rendimento se torne disponível para o beneficiário.

5. Impugnação e Recursos pelo INSS
No caso de conciliação, o termo que for lavrado, relativamente ao INSS, não vale como decisão irrecorrível (artigo 831, parágrafo único, da CLT).
Agora, em caso de acordos homologados judicialmente, o artigo 832, § 4º, da CLT, com redação dada pela Lei nº 10.035/00, obriga as Varas do Trabalho a intimarem o INSS, sendo-lhe facultado interpor recurso relativo às contribuições que lhe forem devidas. Isto, entretanto, apenas relativamente a verbas indenizatórias decorrentes de vínculo empregatício, como bem destaca o referido dispositivo: “O INSS será intimado, por via postal, das decisões homologatórias de acordos que contenham parcela indenizatória, sendo-lhe facultado interpor recurso relativamente às contribuições que lhe forem devidas”.
Neste passo, vale lembrar decisão unânime da E. 2ª Turma do TRT da 9ª Região, de 09 de outubro de 2001 (RO 3.700/01), respeitante a caso visto às mancheias na Justiça do Trabalho, o de “acordo sem reconhecimento de vínculo empregatício”, onde é mantida a alegada condição de autônomo do reclamante. Na hipótese tal, destacou o Eminente Relator, Juiz Ney José de Freitas: estando expressa na decisão homologatória a incidência da contribuição previdenciária do autônomo, a intimação do INSS, a rigor, é desnecessária, visto não se tratar o valor de verba indenizatória, não possuindo ele (o órgão previdenciário), de conseqüência, qualquer interesse recursal, por absoluta falta de sucumbência.
Já em relação às sentenças cognitivas não há igual imposição. Somente por oportunidade da liquidação é que o INSS poderá falar sobre o crédito previdenciário (artigo 879, parágrafos 3º, da CLT) e, em seguida, discuti-lo, por ocasião dos embargos à execução (artigo 884, parágrafos 3º e 4º, da CLT), e, se for o caso, posteriormente, em agravo de petição, sempre, vale lembrar, seguindo o rito e os prazos normais, sem qualquer privilégio ou atropelamento:
“... a Previdência Social, se pretender ofertar impugnação à conta, deverá fazê-lo no prazo de cinco dias previsto no caput do referido artigo 884 /CLT, não sendo o caso de outorga ao ente previdenciário de qualquer prazo especial”[1].
Assim é que, agravo de petição, nos termos do artigo 897, letra “a”, da CLT, só caberá em face de efetiva “sentença de liquidação”, e não de despacho destinado a simples propulsão processual, sem caráter definitivo.
Embora certos despachos não se limitem a uma finalidade meramente impulsionadora do processo, envolvendo verdadeira decisão, no processo do trabalho, como no processo civil, a regra é a de que destes despachos, chamados ordinários, ou de mero expediente, não cabe recurso (CPC, art. 504). Não se deve olvidar, ainda, que mesmo a decisão interlocutória não é recorrível no processo do trabalho (art. 893, parágrafo 1º, da CLT).
Doutrina Manoel Antônio Teixeira Filho:
"Por princípio, apenas comportam agravo de petição as sentenças, ainda que não ponham fim ao processo...; conseqüentemente, não são impugnáveis, por esse remédio, os despachos de mero expediente, os despachos com cunho decisório (exceto os que denegarem a inter­posição de recurso) e as decisões interlocu­tórias, observada quanto a estas a regra do art. 893, parágrafo 1º, da CLT” (Sistema dos Recursos Trabalhistas. 8ª ed. São Paulo: LTr, 1995. p. 297).
A Constituição das Leis do Trabalho, efeti­vamente, não especifica quais as decisões que são recorríveis por meio do agravo de petição. Porém, este procedimento deve ser ob­servado, porque se afina com os ideais de celeridade processual, na medida em que evita o prolongamento da execução com a impug­nação de qualquer ato decisório do juiz, conforme jurisprudência:
"A Consolidação das Leis do Trabalho não es­pecifica o tipo de decisão que enseja o re­curso de agravo de petição, mas entende a doutrina que este só tem cabimento contra sentenças terminativas ou definitivas prola­tadas no processo de execução. A rigor, o agravo de petição só pode vir a ser inter­posto depois da decisão de embargos à exe­cução, o que pressupõe que o juízo esteja seguro pela penhora ou pelo depósito. A par­tir daí continua-se a verificar a natureza da decisão através de seu conteúdo: se não é apenas ordenatória do processo, cabe agravo de petição...” (AP 19/85. AC. 1.072/85. Rel. Juiz Indalécio Gomes Neto. DJPR 12.06.85).
O INSS, assim, sem antes apresentar impugnação e sem ter, por conseqüência lógica, decisão resolutiva desta, induvidosamente não pode apresentar agravo de petição.
O Professor Sergio Pinto Martins, no particular, é enfático: “Não caberá o agravo de petição contra decisões interlocutórias na execução, que somente serão recorríveis quando da apreciação do merecimento das decisões definitivas (§ 1º do art. 893 c/c § 2º do art. 799 da CLT e En. 214 do TST). (...) Não caberá, também, agravo de petição se não houver embargos de devedor, ou impugnação à sentença de liquidação” (MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 392).
Esta seqüência processual antes descrita não pode ser desvirtuada nem mesmo se, porventura, nesta fase, as partes chegarem a se conciliar. A conciliação aí não vai atrair, ao contrário do que se possa imaginar, a faculdade concedida pelo § 4º do artigo 832 da CLT, pois ela é própria da fase cognitiva. E ainda que não fosse, o vocábulo “recurso” a que alude, só poderia ser entendido na execução, dadas as peculiaridades desta, como alusivo ao meio inerente próprio, sem dispensa do cumprimento das formalidades legais enquanto exigências naturais prévias, condicionantes da sua admissibilidade.
Para a Receita Federal não há qualquer previsão legal quanto à a possibilidade de discutir os valores a serem recolhidos a título de imposto de renda no âmbito da Justiça do Trabalho. Discordando do valor fixado ou recolhido, resta-lhe acionar ou o empregador ou o pró­prio empregado, conforme seja o caso, admi­nistrativamente ou perante a Justiça Comum.
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[1] VALLE, Márcio Ribeiro do. Execução das Contribuições Previdenciárias emergentes das decisões da Justiça do Trabalho – Lei nº 10.035, de 25.10.00. Suplemento LTr 64-12/1.501.
http://www.trt22.gov.br/index.php?arq=informacoes/artigos/descontosprevidenciarios.php

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